quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Governo autoriza Congresso a incluir reajuste no vale-refeição de 540 mil servidores no Orçamento

Folha Online
MÁRCIO FALCÃO

Na tentativa de diminuir a pressão de servidores federais que articulam entrar em greve em novembro, o governo autorizou o Congresso a reajustar o valor do vale-refeição no ano que vem. O relator do Orçamento de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), anunciou nesta segunda-feira que reservou R$ 930 milhões para garantir o aumento no benefício.
A medida envolve 540 mil servidores. O índice do aumento vai ser definido pelo governo após a aprovação da proposta orçamentária pelo Congresso, mas o relator sugeriu um incremento no benefício que pode chegar até 103%.
O valor do vale-refeição está congelado desde 2004 e hoje variam de R$ 126 a R$ 161,99, dependendo do Estado e da categoria.
Pela proposta do relator, os valores do vale ficarão entre R$ 256 e R$ 330. Segundo Magela, apesar de o Congresso ainda precisar encontrar uma fonte de recursos para cobrir um buraco de R$ 22 bilhões, o reajuste está garantido porque há uma revisão na previsão de crescimento da economia, passando de 4,5% para 5% do PIB (Produto Interno Bruto).
"Esse valor precisa ser corrigido porque está a um longo tempo sem correção e o próprio governo tem declarado que é intenção em rever este valor", disse.
O relator afirmou ainda que espera o resultado do relatório de reestimativa de receita para avaliar se haverá ou não cortes no orçamento de 2010. Magela disse, no entanto, que os recursos reservados para reajuste dos servidores, para programas sociais e para as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) serão preservados.
"Nessas áreas, não vamos mexer. Já há previsão orçamentária para esses pontos e não vamos alterar", afirmou.
Segundo a Condsef (Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal), servidores federais podem entrar em greve a partir do dia 10 de novembro se o governo não sinalizar que vai cumprir acordos de reajuste fechados, entre 2007 e 2009, com diversas categorias.
A categoria cobra, entre outras medidas, a formação de um grupo de trabalho para debater propostas para a saúde e para a reestruturação da carreira dos servidores.
De acordo com o relator, uma das alternativas para recompor o rombo no Orçamento pode ser o corte em emendas de bancada e nas emendas individuais. "Se fosse hoje, esse corte seria de 100% nas emendas de bancada", disse.

Policlínica 2 retoma atendimento nesta quarta-feira

EPTV

A Policlínica 2 de Campinas retoma o atendimento ao público nesta quarta-feira (21). Há uma semana, os funcionários suspenderam as atividades, para exigir melhores condições de trabalho.
Apesar do fim da paralisação, o sindicato adiantou que pretende entrar com pedido de embargo e interdição do prédio, localizado na Rua Campos Sales, no centro da cidade. O pedido será encaminhado à Delegacia Regional do Trabalho, à Defesa Civil e ao Corpo de Bombeiros.
De acordo com a assessoria da Prefeitura de Campinas, a administração começou a atender algumas das reivindicações dos funcionários, entre elas a vistoria da rede elétrica e a instalação dos bebedouros e o equipamento que separa o encanamento de esgoto da caixa d'água deve ser instalado até o final de outubro.
PrecariedadeNa terça-feira, funcionários da Policlínica II, em Campinas e o Sindicato dos Servidores fizeram novas denúncias de precariedade no posto de saúde, localizado na avenida Campos Sales, no centro.
A EPTV teve acesso ao interior do prédio, onde podem ser vistos as más condições das instalações elétricas e hidráulicas. Um banheiro foi improvisado como local de revelação de chapas de raio-x.
Até equipamentos básicos estão com problemas. Segundo o coordenador do Sindicato dos Servidores, Marionaldo Maciel, o colete usado pelos técnicos que fazem o raio-x não é adequado. O chumbo fica apenas na parte do baixo do equipamento e praticamente não protege o profissional.
O secretário municipal de Saúde, Francisco Kerr Saraiva, disse que os funcionários devem retornar ao trabalho e que o posto de saúde tem condições de atender aos pacientes. A prefeitura tem um projeto aprovado pelo Ministério da Saúde para a construção da nova Policlínica 2, mas ainda não há sequer um local definido para a construção do prédio.
Saraiva disse ainda que no laboratório de revelação de raio-x, apenas a entrada do local é feita pelo banheiro, mas que o trabalho é realizado em uma sala ao lado. Disse ainda que os problemas de manutenção serão resolvidos.

Justiça ordena volta de serviço de saúde em Campinas

Estadão

SÃO PAULO - A Secretaria de Saúde de Campinas informou hoje que, por determinação judicial, o atendimento de serviço ambulatorial na Policlínica 2 deverá ser restabelecido. Os 152 servidores estão em greve desde semana passada para cobrar melhores condições de trabalho no prédio onde a unidade funciona. A água que sai das torneiras estaria contaminada pela rede de esgoto. A Secretaria de Saúde comunicou que algumas reformas já foram iniciadas na unidade. Os trabalhos incluem intervenções nas redes hidráulica, elétrica e na estrutura predial. Para o Secretário de Saúde de Campinas, José Francisco Kerr Saraiva, o prédio é antigo, mas não oferece risco ao trabalho. Diariamente, são atendidas cerca de 600 pessoas no local, a maioria idosos.

DEM apresenta pedido para criar CPI contra o MST

Evandro Éboli

BRASÍLIA. Com o apoio expressivo de deputados de partidos da base do governo, os líderes do DEM apresentaram ontem pedido de abertura de CPI mista para investigar o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). O partido conseguiu colher o apoio de 188 deputados, quando eram necessárias 171 assinaturas; e ainda de 35 senadores, quando o mínimo era de 27.
O requerimento será lido em sessão do Congresso hoje. Para evitar a instalação da CPI, o governo terá o prazo até a meia-noite para convencer deputados a recuarem e retirarem suas assinaturas.
Dos 188 deputados que assinaram, 68 são da base do governo, que representam 36%, apoiaram a criação da comissão.
Para evitar a CPI e o desgaste do governo, líderes da base do presidente Lula terão que convencer 17 deputados a mudar de opinião.
Entre os deputados governistas que assinaram estão Silas Brasileiro (PMDB-MG), que ocupou a secretaria executiva do Ministério da Agricultura no atual governo, e Aelton de Freitas (PR-MG), parlamentar ligado ao vice-presidente, José de Alencar. Aelton foi suplente de Alencar no Senado.
Numa tentativa anterior de instalar a CPI, o DEM não obteve êxito porque 43 deputados tiraram seus nomes. Mas o episódio de sem-terra destruindo uma plantação de laranjas no interior de São Paulo deu fôlego para a oposição, e vários parlamentares que não aderiram antes assinaram agora.
O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), afirmou que há um clima favorável à instalação da CPI do MST. A oposição quer investigar repasse de recursos do governo para entidades ligadas ao movimento.
Pelo menos no discurso, o governo não pretende trabalhar para que deputados de sua base recuem.
— Vamos nos preparar para a CPI — disse o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), líder do partido na Câmara.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Arsenal de guerra Governo do Rio rompe linha de acomodação ao crime, mas ainda deve vitórias duradouras sobre as gangues do tráfico

IMAGENS fortes como a do helicóptero derrubado no Rio, levando à morte três policiais, produzem a impressão de que a insegurança da população carioca estaria aumentando, e os traficantes, vencendo a disputa pelos morros. Na realidade, esse tipo de confronto também pode prenunciar o oposto: reconquista de territórios cedidos ao crime por décadas de política de acomodação irresponsável.
As 21 mortes contabilizadas até a tarde de ontem são baixas revoltantes de uma guerra suja, que não poupa inocentes forçados a morar na linha de tiro entre policiais e facínoras, e entre gangues rivais. O episódio causa ainda mais consternação por ter ocorrido apenas 15 dias depois de a cidade ser escolhida a sede dos Jogos Olímpicos de 2016.
A estratégia comandada pelo governador Sérgio Cabral (PMDB) e seu secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, decerto expõe as autoridades a constante desgaste -pois as ocasiões para reveses, como o de sábado, se multiplicam. Não se pode negar-lhes, porém, o mérito de tomar a iniciativa do combate, antes quase monopólio dos bandidos. Muito da ação policial ainda é reativa, como apontou na Folha a antropóloga Alba Zaluar, mas o abandono da população feita refém foi rompido.
Embora fracassada, a ação policial do fim de semana teria sido fruto de atividade investigativa: a informação sobre a tentativa de invasão do morro dos Macacos por criminosos do São João teria sido obtida pela polícia. Falta à força pública demonstrar-se capaz de converter o necessário esforço de investigação em ações preventivas eficazes e menos letais. A polícia mata mais de mil pessoas por ano no Estado do Rio, contra cerca de 400 em São Paulo.
Está correta a iniciativa de manter a presença do Estado nos territórios conflagrados com "unidades policiais pacificadoras" (UPPs) -o policiamento comunitário, recomendado há anos por especialistas. Apenas cinco comunidades contam com UPPs; outras cinco viriam até dezembro. Nesse passo, só nas vésperas da Copa de 2014 seriam contemplados os 47 locais mapeados como prioritários.
Não basta a presença da polícia, no entanto, para pacificar essas áreas urbanas. Uma vitória duradoura, que retire dos comandos criminosos o acesso rotineiro a um verdadeiro arsenal de guerra, está por ser conquistada. O Estado, ademais, precisa levar alternativas de renda e emprego aos morros, sobretudo para os jovens entre os quais o tráfico recruta seus soldados.
O governo do Rio investe quantias significativas em equipamento e treinamento e está entre os quatro Estados que destinam à segurança mais de 12% do total de gastos anuais. Por outro lado, paga o segundo pior soldo do país para PMs novatos, cerca de R$ 1.000 mensais.
Resta, obviamente, ainda muito por fazer para pacificar a cidade. A Copa e a Olimpíada dão ensejo a que se amplie a mobilização para assegurar aos moradores do Rio o direito de viver em segurança.

Sem defesa

O início da execução do projeto de ocupação definitiva de favelas, por meio de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), uma iniciativa inovadora para substituir as desgastantes operações de entradas e saídas nessas chamadas comunidades, de baixa efetividade e perigosas para moradores e policiais, é acompanhado com otimismo, por abrir espaço para o Estado retomar de fato o controle dessas áreas.
Mas a guerra deflagrada por traficantes no fim de semana pelo controle dos pontos de vendas de drogas no Morro dos Macacos, Vila Isabel, envolveu a cidade no clima de insegurança já conhecido de outras explosões de violência. Funcionou como um alerta para as dificuldades que persistem. Com a autoestima do carioca revigorada pela vitória na escolha da sede dos Jogos de 2016, foram um baque as cenas de enfrentamento bélico, com a demonstração de grande poder de fogo da bandidagem dada na queda de um helicóptero da polícia, alvejado por arma de alto calibre. Parecia que todos os prognósticos positivos para o Rio provenientes dos Jogos e de mudanças na política de segurança pública, como as UPPs, deixavam de existir. Porém, em vez de atemorizar governos e colocar em xeque a política de segurança, os acontecimentos de Vila Isabel devem é levar as autoridades, de todos os níveis da administração pública, a trabalhar de forma cada vez mais coordenada e, no caso do Rio de Janeiro, apressar a ampliação de efetivos da PM, para a extensão da rede de UPPs. A própria discussão sobre a crise de segurança pública enfrentada pelo país precisa ser mais ampla, aprofundada, para as necessárias mudanças de legislação e aprimoramentos administrativos.
O que existe no país é uma afronta ao estado de direito A pergunta a ser feita é se o Estado tem os instrumentos para se contrapor e conter o crime. Infelizmente, o arcabouço de legislação criminal é defasado.
Talvez eficaz para um Brasil da primeira metade do século passado, quando ele ainda não era mercado consumidor e rota de passagem de drogas. Uma legislação que concede liberdade condicional a criminosos consumados, apenas porque demonstram “bom comportamento” na cadeia, é inócua. O mesmo vale para o Estatuto do Menor, pelo qual jovens de até 18 anos, frios assassinos, são tratados como se ostentassem apenas algum desvio de caráter, a ser corrigido com a maturidade. O fim de semana em Vila Isabel reforça a consciência de que esta luta não é apenas carioca.
Se o Executivo federal, Congresso, Justiça e MP não trabalharem visando a dar poderes ao Estado para defender a sociedade, a cadeia de violência não será rompida.

Oposição faz nesta terça nova tentativa de criar CPI do MST

O Globo

Os partidos de oposição fazem nesta terça-feira (20) mais uma tentativa de criar uma CPI para investigar o repasse de dinheiro público ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A senadora Kátia Abreu (DEM-TO) e o deputado Ônix Lorenzoni (DEM-RS) dizem já ter o número necessário de assinaturas para a instalação da CPI. Eles pretendem protocolar o requerimento de criação da comissão às 16h.
Para o pedido de CPI mista, são necessárias 171 assinaturas de deputados e 27 de senadores. Uma vez protocolado, o pedido deve ser lido e votado no Congresso. A leitura do requerimento deve ocorrer nesta quarta-feira (21). O prazo para retirada de assinaturas acaba também na quarta-feira, à meia-noite.
Essa é a segunda tentativa de criação de uma CPI para investigar o MST. No último dia 30, um pedido da bancada ruralista de instalação de uma comissão chegou a ser lido em plenário, mas 15 parlamentares retiraram suas assinaturas do documento antes do fim do prazo, o que inviabilizou a criação da CPI.
A nova tentativa de investigar o movimento ganhou força depois que integrantes do movimento destruíram parte de um laranjal com um trator na Fazenda Santo Henrique, em Borebi, no interior de São Paulo, há quase duas semanas. A ação do MST foi criticada por senadores de oposição e governistas, além do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ministros e pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. “Isso [a destruição do laranjal] é mais uma ação do MST irracional e ilegal e com financiamento público, que é o que mais traz indignação à população”, disse a senadora Kátia Abreu. Convidado a falar sobre o repasse de verbas públicas ao MST, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, negou em depoimento no Senado no último dia 13 que recursos de sua pasta sejam repassados ao movimento. Ele contestou levantamento divulgado na semana passada pelo líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), de que o ministério teria repassado entre 2004 e 2008 mais de R$ 115 milhões a entidades que seriam ligadas ao movimento.

Governo estuda criar "comissão da verdade"

FLÁVIO FERREIRA

O governo federal vai decidir hoje sobre a criação de uma "comissão da verdade" para investigar violações aos direitos humanos ocorridas no período da ditadura militar (1964-1985), disse ontem o ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi.
O tema faz parte de projeto do novo programa nacional de direitos humanos, que será debatido em reunião hoje entre Vannuchi, o presidente Lula e o ministro da Defesa, Nelson Jobim.
Ontem, na abertura da Conferência Nacional sobre o Direito à Verdade, na USP (Universidade de São Paulo), Vannuchi disse que os trabalhos das comissões que existem hoje para apurar questões ligadas à ditadura- a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e a Comissão de Anistia- não são suficientes para fazer "a recuperação histórica, de reconstruir e reconhecer formalmente, enquanto Estado, que aconteceu isso [violações aos direitos humanos]".
Para ele, uma "comissão da verdade" poderá levar o Estado brasileiro a "formalmente pedir desculpas e demonstrar que estão construídas estruturas que garantem a não repetição daquelas violências".
Segundo Vannuchi, 29 ministérios aprovaram a redação do novo programa de direitos humanos, mas o Ministério da Defesa pediu uma discussão sobre a instituição da comissão. O ministro disse que promoverá discussões sobre a forma de criação, composição e poderes do comitê, caso a proposta seja aprovada na íntegra hoje.

Ministro questiona versão de militares sobre arquivos

Roldão Arruda

O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos, disse ontem que considera inaceitável a versão, dada pelas Forças Armadas, de que os arquivos secretos dos órgãos militares, referentes à repressão política no período da ditadura, não existam mais. "Trabalho há 40 anos com direitos humanos e não aceito a tese de que todos os arquivos em poder das Forças Armadas tenham sido destruídos", afirmou.
As afirmações de Vannuchi foram feitas durante a sessão de abertura da Conferência Internacional sobre o Direito à Verdade, organizada pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP). Um dos objetivos do evento, que conta com o patrocínio da secretaria de Vannuchi, é discutir a criação de uma comissão nacional de verdade, com a tarefa de esclarecer violações de direitos humanos ocorridas no período da ditadura militar e apontar os responsáveis pelos crimes.
Vannuchi defende a criação do grupo. Com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele tem estimulado iniciativas para tentar resgatar informações ainda ocultas do período da ditadura. Uma de suas metas é esclarecer as histórias de 140 opositores do regime militar que, depois de terem sido detidos pelos órgãos de repressão, desapareceram e nunca tiveram os corpos localizados.
As iniciativas de Vannuchi esbarram quase sempre, porém, nas Forças Armadas, cujos arquivos, que poderiam conter informações sobre os desaparecidos, nunca foram abertos. Segundo informações oficiais, já teriam sido destruídos.
"Quem decidiu destruir os arquivos? Quando isso ocorreu? Como foi feito? Não há nenhum registro sobre isso, o que é estranho, pois se sabe que tudo que ocorre nas Forças Armadas é cuidadosamente registrado", disse Vannuchi.

MAIS PRESSÕES
De maneira indireta, o ministro admitiu que o governo do qual faz parte não tem força política para determinar a localização e a abertura dos arquivos militares - uma vez que se trata de um "presidencialismo de coalizão", com divergências no interior do próprio ministério. Diante desse cenário, ele considera positivas as pressões da sociedade do País e de organizações internacionais sobre o Estado brasileiro, para que esclareça a verdade.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, também convidado para a abertura da conferência, enviou uma mensagem explicando que, por problemas na agenda, não poderia participar.
O advogado José Gregori, que chefiou a pasta de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso, também defendeu a criação de uma comissão de verdade. Na opinião de João Vicente Goulart, filho do presidente João Goulart, deposto do cargo com o golpe militar de 1964, a comissão só teria sentido se os responsáveis pelos crimes também fossem julgados. "Só teremos direito à verdade se tivermos direito à Justiça", disse ele, durante o depoimento que fez na abertura da conferência.

Indignação com as laranjeiras

Da Folha de S. Paulo

Há uma semana, duas queridas amigas disseram-me da sua indignação contra os invasores de uma fazenda e a destruição de pés de laranja. Uma delas perguntou-me antes de qualquer outra palavra: "E as laranjeiras?" -como se na pergunta tudo estivesse dito.
Essa reação foi provavelmente repetida por muitos brasileiros que viram na TV aquelas cenas. Não vou defender o MST pela ação, embora esteja claro para mim que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é uma das únicas organizações a, de fato, defender os pobres no Brasil. Mas não vou também condená-lo ao fogo do inferno. Não aceito a transformação das laranjeiras em novos cordeiros imolados pela "fúria de militantes irracionais".
Quando ouvi o relato indignado, perguntei à amiga por que o MST havia feito aquilo. Sua resposta foi o que ouvira na TV de uma das mulheres que participara da invasão: "Para plantar feijão". Não tinha outra resposta porque o noticiário televisivo omitiu as razões: primeiro, que a fazenda é fruto de grilagem contestada pelo Incra; segundo, que, conforme a frase igualmente indignada de um dos dirigentes do MST publicada nesta Folha em 11 deste mês, "transformaram suco de laranja em seres humanos, como se nós tivéssemos destruído uma geração; o que o MST quis demonstrar foi que somos contra a monocultura".
Talvez os dois argumentos não sejam suficientes para justificar a ação, mas não devemos esquecer que a lógica dos movimentos populares implica sempre algum desrespeito à lei. Não deixa de ser surpreendente indignação tão grande contra ofensa tão pequena se a comparamos, por exemplo, com o pagamento, pelo Estado brasileiro, de bilhões de reais em juros calculados segundo taxas injustificáveis ou com a formação de cartéis para ganhar concorrências públicas ou com remunerações a funcionários públicos que nada têm a ver com o valor de seu trabalho.
Por que não nos indignarmos com o fenômeno mais amplo da captura ou privatização do patrimônio público que ocorre todos os dias no país? Uma resposta a essa pergunta seria a de que os espíritos conservadores estão preocupados em resguardar seu valor maior -o princípio da ordem-, que estaria sendo ameaçado pelo desrespeito à propriedade.
Enquanto o leitor pensa nessa questão, que talvez favoreça o MST, tenho outra pergunta igualmente incômoda, mas, desta vez, incômoda para o outro lado: por que os economistas que criticam a suposta superioridade da grande exploração agrícola e defendem a agricultura familiar com os argumentos de que ela diminui a desigualdade social, aumenta o emprego e é compatível com a eficiência na produção de um número importante de alimentos não realizam estudos que demonstrem esse fato?
A resposta a essa pergunta pode estar no Censo Agropecuário de 2006: embora ocupe apenas um quarto da área cultivada, a agricultura familiar responde por 38% do valor da produção e emprega quase três quartos da mão de obra no campo.
O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, nesta Folha listou esses fatos e afirmou que uma "longa jornada de lutas sociais" levou o Estado brasileiro a reconhecer a importância econômica e social da agricultura familiar. Pode ser, mas ainda não entendo por que bons economistas agrícolas não demonstram esse fato com mais clareza. Essa demonstração não seria tão difícil -e talvez ajudasse minhas queridas amigas a não se indignarem tanto com as laranjeiras.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

Funcionários da saúde fazem greve em Campinas

PRISCILA TRINDADE

SÃO PAULO - Os funcionários da Policlínica 2, no centro de Campinas (SP), continuam em greve para cobrar condições de trabalho melhores. Os funcionários da área da saúde alegam, desde sexta-feira, questões sanitárias. A água que sai das torneiras estaria contaminada pela rede de esgoto. Para o Secretário de Saúde de Campinas, José Francisco Kerr Saraiva, a paralisação não se justifica, porque, apesar de o prédio ser antigo, ele não oferece risco ao trabalho. "Este mês, o atendimento foi suspenso na unidade durante dois dias para a realização de trabalhos de reparo na parte hidráulica", disse. De acordo com o secretario, a unidade atende cerca de 600 pessoas por dia, a maioria idosos.

Cobrança de novos pedágios na Rodovia D.Pedro I, em SP, começa nesta terça-feira

O Globo

SÃO PAULO - A Rodovia D. Pedro I (SP-065), que liga Jacareí a Campinas, em São Paulo, passa a operar novos pedágios nesta terça-feira. Foram criados dois novos postos de cobrança no percurso. Um deles fica no km 26,5, em Igaratá, e custa R$ 5,80 para automóveis e por eixo comercial. Para motos, R$ 2,90. A rodovia faz parte do corredor de exportação paulista e sua administração foi transferida para a iniciativa privada em 2008.
O segundo novo pedágio fica em Atibaia, no km 79,9, e a tarifa será de R$ 4,60, sendo R$ 2,30 para motocicletas. Moradores de Igaratá e Atibaia protestam, pois as praças de cobrança dividem bairros das duas cidades. A concessionária diz que o edital de licitação não previu isenção para os moradores das cidades.
Haverá mudança também no valor cobrado em Itatiba, km 110,1, onde os carros de passeio e eixo comercial pagarão R$ 5,60 e motociclistas R$ 2,80, nos dois sentidos. Até agora, veículo de passeio pagava apenas uma vez (unidircional) a tarifa de R$ 9,00. Agora, pagará R$ 11,20.
O outro pedágio já existente fica no km 55, em Nazaré Paulista. O preço é R$ 9 e a cobrança unidirecional para veículos a passeio e bidirecional para veículos comerciais.
Confira novas as praças:
Igaratá Km 26,5: R$ 5,80
Atibaia Km 79,9: R$ 4,60
Itatiba Km 110,1: R$ 5,60
Os usuários que desejam mais informações podem ligar para 0800-770-8070. O serviço funciona 24 horas por dia.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O poderio bélico do tráfico

O Globo

O helicóptero Phenix 3, modelo Esquilo AS-350 B2, do Grupamento Aéreo Marítimo (GAM) da PM, pode ter sido derrubado por um disparo de munição antiaérea. A hipótese foi admitida pelo secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame, com a ressalva de que a identificação da arma depende do resultado das análises feitas pelos peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE). A aeronave do GAM foi atingida no sábado, quando apoiava uma operação no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, onde facções rivais travavam uma batalha pelo controle dos pontos de venda de drogas.
Durante o enterro dos dois soldados mortos na queda da aeronave, Beltrame disse que a polícia ainda está investigando o que teria atingido e derrubado o helicóptero do GAM:
- Em tese, a arma usada pelos bandidos poderia seria um fuzil 7.62 ou armas de calibre .30 ou .50 - disse o secretário.
De acordo com Beltrame, o uso de um lança-rojão pelos traficantes para derrubar o helicóptero é pouco provável, pois as consequências do emprego da arma teriam sido bem maiores.
A hipótese de os bandidos terem usado uma metralhadora .30 para derrubar o helicóptero do GAM é reforçada pelo aumento das apreensões desse tipo de armamento. Conforme O GLOBO noticiou em agosto do ano passado, somente nos primeiros sete meses de 2008 nove metralhadoras .30 foram recolhidas com traficantes do Rio, informação revelada a partir de estatística da Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (Drae), da Polícia Civil. Duas estavam com traficantes do Complexo do Alemão, em Ramos. A região é dominada pela mesma facção que invadiu o Morro dos Macacos, no fim de semana.
Entre os modelos de metralhadora .30 (7,92 x 57mm) apreendidos figura a Lehky Kulomet ZB, fabricada na antiga República da Tchecoslováquia, com capacidade de tiro capaz de derrubar até um helicóptero. Armas de guerra de uso restrito a militares teriam sido desviadas de quartéis do exército boliviano. Uma bala disparada por essa arma pode atingir um alvo a 1.500 metros de distância. E com precisão maior do que os tiros de fuzis: uma metralhadora .30 pode disparar mais de 50 tiros automaticamente.
Ontem, a Assinap (associação formada por policiais militares e bombeiros) anunciou uma recompensa de R$10 mil por informações que levem à captura dos traficantes que derrubaram o helicóptero da PM. O anúncio foi feito durante o enterro dos dois policiais mortos no helicóptero. Edney Canazaro de Oliveira e Marcos Stadler Macedo foram sepultados no Jardim da Saudade, Sulacap. Durante o velório, o presidente da Assinap, Miguel Cordeiro, aproveitou para protestar contra as condições em que trabalham os policiais. Ele distribuiu um manifesto pedindo melhores salários e equipamentos de proteção. Além dos dois PMs, até ontem, a guerra já tinha provocado a morte de outras 15 pessoas.
- O policial militar trabalha estressado, se arrisca e é o mais mal pago do país - ele disse.
Emocionada, Rosa Maria Barbosa, tia do soldado Edney, desabafou:
- Um menino novo, que entrou para a polícia almejando uma carreira bonita e que acaba assim por descaso do governo. Existe verba para Olimpíadas, Copa. Agora, para equipar a polícia, dar vida digna aos que estão trabalhando para a segurança do povo, não. Eles dão helicóptero sem ser blindado e mandam o policial dar a cara para morrer. Até quando? A marginalidade está se sobrepondo.
Cerca de mil pessoas, em sua maioria policiais, acompanharam o enterro. Helicópteros da PM e da Polícia Civil sobrevoaram o local jogando pétalas de rosas. Além do secretário Beltrame, o comandante geral da PM, Mario Sergio Duarte, e o comandante do GAM, Eduardo Luiz Brandão estiveram presentes, mas não quiseram dar entrevistas. O capitão Marcelo Vaz, que pilotava o helicóptero abatido pelos bandidos, também esteve no cemitério. Com a mão esquerda enfaixada por causa de queimaduras, ele cumprimentou as famílias dos ex-companheiros e foi embora dizendo que estava "muito transtornado".
Bastante emocionado e também com queimaduras na mão, o cabo Gonçalves, que estava em outro helicóptero e ajudou a socorrer os feridos, relembrou o episódio:
- Foi tudo muito rápido. Quando olhei, a aeronave já estava pegando fogo. Fizemos o que foi possível.
O helicóptero abatido havia acabado de socorrer um policial baleado no morro, tinha ido abastecer e estava a caminho de um segundo resgate quando foi atingido. Dos seis tripulantes, dois morreram carbonizados. Edney Canazaro de Oliveira faria 30 anos no próximo dia 15. Estava casado havia cinco meses e não tinha filhos. Ele cresceu na Ilha do Governador, mas morava atualmente em Vila Valqueire. Era soldado, estava há quatro anos na PM e há um ano e meio no GAM.
- Era uma pessoa que sempre batalhou muito, alguém muito querido. Basta olhar em volta - dizia Ludmila Calado, de 62 anos, amiga da família, referindo-se à multidão que se formava na porta da capela. - O sentimento que a gente tem é de revolta.
Na capela ao lado era velado o corpo do soldado Marcos Stadler Macedo. Ele tinha 39 anos, estava há sete na Polícia Militar e há quatro no GAM. Filho único, Marcos perdeu o pai quando era menino, num acidente de carro. Segundo o tio do rapaz, Paulo Stadler, que é supervisor de uma loja de tecidos, o soldado perdeu uma tia, vítima de bala perdida, anos atrás. Marcos tinha uma filha de 2 anos, morava na Taquara e estava fazendo curso para piloto de helicóptero.
Os dois policiais foram sepultados ao som do hino da corporação, executado pela banda da PM. Num cartaz, a letra da Canção do Policial Militar: "Ser policial é sobretudo uma razão de ser, é enfrentar a morte, mostrar-se um forte no que acontecer".
Ao fim do sepultamento, o cabo Daniel da Cruz, colega de Marcos e Edney no GAM, lembrou que eles sempre rezavam juntos antes das operações:
- Eram pessoas que botavam a gente para cima. Nosso sentimento não é de vingar a morte deles. Mas tenho uma filha de 6 anos e quero um Rio de paz. Para quem vem de fora não ficar achando que isso aqui é só pornografia e violência.
Perguntado se tinha medo, o policial respondeu:
- O medo faz parte da profissão. Se eu não tiver posso morrer. Mas tem que ser controlado. O medo descontrolado faz você morrer também.

Deputados dizem que contratações são regulares

Folha de São Paulo

O MST admite que militantes do movimento participam de entidades prestadoras de serviços públicos, mas diz que não tem controle sobre elas nem sobre seus dirigentes, que têm autonomia para pleitear recursos.
A Folha tentou, sem êxito, falar com as entidades que tiveram os sigilos quebrados.
O ministro Guilherme Cassel nega que o governo sustente o MST e outros movimentos com verbas. Recursos só são repassados mediante projeto e é exigida prestação de contas. Para ele, não há provas de que as entidades financiem o MST.
Marco Maia (PT-RS) e Assis do Couto (PT-PR) dizem que a contratação dos servidores foi regular. Maia diz que nunca direcionou emendas a entidades do ex-assessor. "Sou agricultor e não vejo nenhum problema de ter no gabinete pessoas ligadas a sindicatos e assentamentos", disse Couto, que nega ter beneficiado as organizações.

Relatório de CPI vê braço do MST na Câmara

Folha de São Paulo
Fernanda Odilla
da Sucursal de Brasília

Relatório da CPI das ONGs, no Senado, mapeou entidades ligadas ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que contam com representantes na Câmara a trabalhar por mais verbas para si.
O documento revela que parte delas recebeu mais recursos da União depois que seus representantes foram trabalhar para deputados.
O texto cita assessores e ex-assessores dos deputados petistas Marco Maia (RS), Assis do Couto (PR), Anselmo de Jesus (RO) e Adão Preto (RS), já morto. "Suspeita-se da ocorrência de desvio de recursos públicos, bem como formação de quadrilha", diz o relatório.
A Folha apurou que o documento deu base para as quebras de sigilos de ao menos quatro entidades parceiras do MST que receberam cerca R$ 50 milhões dos cofres públicos. São elas: Anca (Associação Nacional de Cooperação Agrícola), Concrab (Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil), Cepatec (Centro de Formação e Pesquisas Contestado) e Fetraf-Sul (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul).
Os deputados localizados pela reportagem admitem que empregaram representantes das entidades. Mas negam ter ligação com o MST.
"É uma afirmativa falsa dizer que há um braço do MST na Câmara. O que existe são deputados ligados a pequenos e grandes agricultores", disse Marco Maia. Durante dois anos, ele manteve um funcionário que, segundo o relatório, tinha relação com 13 entidades.
Assessores e ex-assessores do deputado Assis do Couto também foram citados no documento, que contabilizou repasses de até R$ 46 milhões para entidades representadas por eles. Desse total, R$ 38 milhões foram liberados quando trabalhavam para o deputado.
O texto diz que Couto apresentou 11 emendas no valor de R$ 4,83 milhões para ações da Concrab, da Anca e do MST, ligadas a seus funcionários.

Lula define amanhã enquadramento da Abin

Estadão
Tânia Monteiro

Para sacramentar de vez o enquadramento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou para amanhã reunião do Conselho Nacional de Defesa para discutir a nova Política Nacional de Inteligência, que será encaminhada ao Congresso.
Na reunião realizada no início de setembro, Lula aprovou a política mas pediu que algumas modificações fossem feitas. Ficou definido que todo o sistema de inteligência do governo ficará subordinado ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e não à Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
A nova política de inteligência lista as ameaças que a área de informações do Estado deve combater. O rol inclui terrorismo, narcotráfico, crime organizado, corrupção e sabotagem, entre outras.
Ao listar as ameaças ao Estado, foram lembradas, por exemplo, a guerra cibernética e a espionagem, que ocorrem especificamente na área de tecnologia, no agronegócio e nas indústrias aeronáutica e aeroespacial. O governo quer ainda reforçar as áreas de contrainteligência e os trabalhos voltados para o campo externo.
Na reunião ainda deverão ser definidos os limites de cada setor de inteligência, que atualmente é dividido em quatro grupos - de Estado, militar, econômico-financeiro e de segurança pública.

João Pedro Stédile: MST vai “às ruas” para garantir novos índices

Jornal do Brasil
Vasconcelo Quadros

BRASÍLIA - Mentor e principal dirigente do MST, o economista João Pedro Stédile reconhece que a destruição do laranjal, em uma fazenda no interior de São Paulo, “foi negativa” para o movimento e demonstra estar consciente de que a CPI que investigará os repasses de dinheiro público para a organização deve ser instalada, mas avisa que os sem-terra estão atentos e reagirão caso o governo se dobre à pressão dos ruralistas e não mexa na estrutura da propriedade da terra no Brasil. – Vamos às ruas para garantir a atualização dos índices de produtividade – afirma Stédile nessa entrevista ao Jornal do Brasil ao tocar na questão principal da fase atual da luta pela terra. A adoção dos novos índices, compromisso do governo com o MST, deve gerar desapropriações e aumentar os estoques de terra disponíveis para a reforma agrária. Ainda assim, o dirigente diz que, “infelizmente”, o presidente Lula perdeu a “oportunidade histórica de fazer a reforma”. Sobre a acusação de que o MST utiliza ONGs de fachada para receber recursos públicos, Stédile lembra que o repasse de recursos são feitos através de um sistema de convênios desenhado por Fernando Henrique Cardoso e garante que o MST não usa dinheiro público para invadir terras. – As ONGs fazem o papel que deveria ser do governo – afirma.
O governo deve tomar uma decisão em breve sobre os novos índices de produtividade para as grandes propriedades rurais. Que impacto a mudança pode provocar na estrutura fundiária?
- O impacto é pequeno. Mesmo assim, os latifundiários, o agronegócio e a mídia conservadora não admitem que se cumpra a Lei agrária, que determina a atualização regular dos índices de produtividade. Os dados utilizados atualmente são de 1975. Por que eles têm tanto medo? Fora isso, não basta apenas atualização dos índices para fazer a Reforma Agrária. É preciso mudar o modelo agrícola e cumprir a Constituição, que determina que sejam desapropriadas as grandes áreas que não tem função social e não cumprem a lei trabalhista, agridam o ambiente e estejam abaixo da média da produtividade. O censo do IBGE concluiu que temos menos de 15 mil latifundiários com áreas maiores de 2.500 hectares, com um total de 98 milhões de hectares. É muita terra nas mãos de pouca gente, que nem mora no campo.
O MST está confiante numa decisão favorável à revisão dos índices, ou há o receio de que o governo recue do compromisso assumido? Como o senhor imagina que o governo vai administrar a resistência do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes?
- Quando o governo fez o anúncio da atualização dos índices, já sabia da reação dos setores conservadores e da posição do ministro do agronegócio. Não é uma surpresa. Quem ganhou a eleição foi o Lula, não o ministro. Não acreditamos que o governo volte atrás. A mudança dos índices é uma reivindicação dos camponeses e dos setores progressistas da sociedade. Somente com a força do apoio popular ao governo Lula poderão ser modificados. E estamos atentos e vamos voltar às ruas para denunciar a ofensiva do latifúndio e garantir a atualização dos índices.
De que maneira o fato do governo oscilar politicamente entre o agronegócio e a agricultura familiar afeta as ações do MST? E como o senhor resumiria a visão que o MST tem hoje do que foram esses sete anos de governo Lula? Qual é o aspecto mais positivo e qual o mais negativo?
- Infelizmente, o governo não fez a Reforma Agrária e perdemos mais uma oportunidade histórica. O censo agropecuário demonstra que aumentou a concentração de terras no Brasil, que é líder nesse vergonhoso ranking mundial. Temos famílias acampadas há seis anos. O governo é de composição de interesses, sob hegemonia dos bancos, das transnacionais e do agronegócio. A agricultura familiar e camponesa é mais eficiente, produz alimentos em menor área, gera mais empregos, embora receba menos recursos do que o agronegócio.
A repercussão da destruição de parte do laranjal na área ocupada pela Cutrale e a conjuntura podem impor alguma mudança de tática do MST? O movimento repetiria as ações no local?
- A repercussão foi negativa. Foi uma manipulação midiática e ideológica, a partir de uma atitude desesperada das famílias acampadas. Viver em um acampamento por anos e anos leva a uma situação limite. Há muitos vandalismos que o agronegócio e o latifúndio cometem que são consentidos pela mídia. Não podemos aceitar o vandalismo do agronegócio de usar 713 milhões de litros de venenos agrícolas por ano, que degradam o ambiente, envenenam as águas e os alimentos. Depois de diversas ocupações na fazenda da Cutrale, conseguimos denunciar que a maior empresa do setor de suco de laranja do mundo usa um artifício arcaico da grilagem de terras. Por conta do monopólio da Cutrale no comércio de suco e da imposição dos preços, agricultores que plantam laranjas foram obrigados a destruir entre 1996 a 2006 cerca de 280 mil hectares de laranjais.
A ação contribuiu para aumentar o apoio de parlamentares à CPI do MST? Como o movimento reagirá à sua possível instalação? O senhor teria algum problema para comparecer ao Congresso e prestar esclarecimentos?
- Essa CPI é contra o MST. A Rede Globo forjou um escândalo contra a Reforma Agrária. As imagens foram utilizadas pela direita, pela bancada ruralista e pela mídia para desgastar o MST e forçar uma CPI que já tinha sido derrotada. Já foram criadas as CPI da Terra e das Ongs contra o nosso movimento, com investigações exaustivas sobre os temas requentados atualmente. Podemos prestar todo e qualquer esclarecimento. Já existem instituições que fazem o controle dos convênios do governo com entidades da Reforma Agrária, como o CGU, TCU e o MP. Esses parlamentares não confiam nesses órgãos? O tanto de CPI instaladas no último período levaram esse instrumento importante a uma banalização. A CPI contra o MST, por exemplo, tem motivação eleitoral. O demo Ronaldo Caiado, que é fundador da UDR, confessou que o verdadeiro objetivo da CPI é comprovar que o governo repassa dinheiro para o MST fazer campanha para a Dilma. Essa afirmação é no mínimo ridícula para qualquer sujeito bem informado, se não viesse de uma mente improdutiva e reacionária como todo latifúndio.
Qual a relação que o MST mantém com as ONGs que receberam verbas do governo e são apontadas como entidades de fachada do movimento?
- As entidades da Reforma Agrária atuam em assentamentos do MST e de outros movimentos sociais e sindicais, prestam serviços nas áreas de produção agrícola, assistência técnica e educação. Contratam professores e agrônomos para atuar nos assentamentos. Fazem o papel que deveria ser do Estado. O Estado foi dilapidado pelo governo FHC, que inventou essa história de convênios com Ongs. Nós sempre defendemos que o Estado retome os serviços de natureza pública, tanto nos assentamentos como em todo país. Nunca utilizamos dinheiro público para fazer ocupação de terra. Os inimigos da reforma agrária atacam essas entidades porque querem que os assentamentos dêem errado. Se estão preocupados com o dinheiro público, por que não fazem investigações sobre os recursos destinados aos empresários do sistema S, do SENAR e SESCOOP? E essas feiras de agroexposição para fazer propaganda e tantos outros utilizados sempre em beneficio do latifúndio e dos ricos? Você tem idéia de quanto o Tesouro Nacional paga por ano das diferenças de juros das renegociações de dívidas dos ruralistas? São mais de 2 bilhões de reais!
Como o senhor avalia a reação de autoridades do governo, especialmente do presidente Lula condenando e classificando o ato de “vandalismo”? Surpreendeu a maneira veemente como figuras que trabalham pela reforma agrária dentro do governo, a exemplo do ministro Guilherme Cassel e do presidente do Incra, Rolf Hackbart, criticaram a ação?
- Nós também condenamos vandalismo. O presidente Lula e os ministros não tinham conhecimento da versão das famílias acampadas e do ministro de Segurança Institucional general Félix. As famílias nos disseram que não roubaram nem depredaram nada. Da saída das famílias até a entrada da imprensa, o espaço da fazenda foi preparado para produzir imagens de impacto. A direita utilizou repetidamente por meio da mídia as imagens contra a Reforma Agrária. Não vimos nunca a imprensa denunciar a grilagem nem a super-exploração que a Cutrale impõe aos agricultores. O vandalismo da violência social nas grandes cidades provocadas pelo êxodo rural parece não escandalizar a mídia. Vocês do Rio não assistem os vandalismos provocados pelas forças de repressão em despejos de famílias sem teto. A polícia de São Paulo usou trator de esteira para destruir barracos em uma favela. Isso sim é vandalismo contra o povo brasileiro.
Que análise o senhor faz do censo agropecuário do IBGE?
- É um retrato da realidade agrária brasileira, uma vez que os pesquisadores vão pessoalmente a todos os estabelecimentos agrários. Os dados demonstram o que já estávamos denunciando e sentindo no dia a dia: nos últimos dez anos, houve uma brutal concentração da propriedade da terra no Brasil. As propriedades acima de mil hectares controlam nada menos que 43% de todas as terras do país. Já as propriedades com menos de 10 hectares detêm apenas 2,7% das terras. Por outro lado, comprovou que a agricultura familiar e camponesa emprega 75% da mão-de-obra e produz 75% de todos os alimentos, embora receba menos financiamento público. Demonstrou que o agronegócio é um modelo para produzir commodities, às custas da concentração de terras, do êxodo rural, do aumento da pobreza e do envenenamento dos alimentos e da nossa natureza. É um escândalo!
E da pesquisa da CNA/Ibope sobre os assentamentos?
- Foi uma pesquisinha de opinião em nove assentamentos, que não tem relevância nenhuma. É uma perda de tempo. Nos surpreende o Ibope e a imprensa gastar tempo com isso. Um estudo relevante e necessário faria a comparação da situação de uma área antes e depois da criação do assentamento, mesmo nesse quadro desfavorável para a pequena agricultura e para os assentamentos.
Qual é a realidade dos assentamentos rurais em geral, em especial daqueles que resultaram da luta organizada pelo MST? Qual a maior dificuldade enfrentada hoje pelas famílias assentadas?
- Muitos assentamentos ainda enfrentam muitas dificuldades nas áreas de infra-estrutura pública e crédito para produção. No entanto, os assentados deixam de ser explorados, têm trabalho, comida e escola para os filhos. A maioria já tem uma casa própria melhor de quando eram sem-terra. A maior dificuldade é que os assentamentos sozinhos não se viabilizam, sem que haja uma prioridade para um novo modelo agrícola. Precisamos de um programa para a implantação de agroindústrias, na forma de cooperativas, para que se agregue valor e os trabalhadores aumentem a renda e dêem emprego aos jovens. É preciso construir escolas e capacitar professores em todos os níveis, para os jovens não irem para a cidade. É necessário um programa para o desenvolvimento de técnicas agroecológicas, que permitem aumentar a produtividade sem usar veneno, produzindo assim alimentos sadios e baratos para a cidade.
Entre os "presidenciáveis", quem mais agrada ao MST e seus militantes? Mais especificamente, a ministra Dilma Rousseff pode contar com o apoio do movimento em 2010? E a conjuntura política pós-Lula pode forçar alguma mudança tática do movimento?
- Sempre preservamos a nossa autonomia. Os nossos militantes participam das eleições como cidadãos brasileiros. Claro que sempre votam em candidatos que sejam a favor da reforma agrária e de mudanças sociais. Nossa vontade política é impedir a volta do neoliberalismo e discutir um projeto popular de desenvolvimento para o país, que faça mudanças estruturais para resolver os problemas do povo. Infelizmente, cada vez que chega o período eleitoral, a direita se assanha e passa usar todos expedientes para tentar impedir qualquer mudança.